Boletim Tributário - Dezembro de 2019
Temos o prazer de apresentar, a seguir, a edição de dezembro de 2019 de nosso Boletim Tributário, informativo mensal com o objetivo de divulgar novidades legislativas e jurisprudenciais em matéria tributária.
Nesta edição, destacamos os seguintes assuntos:
STF decide sobre a criminalização do ICMS declarado e não pago
STJ – Publicação do acórdão sobre o prazo prescricional para redirecionamento da execução fiscal aos sócios em casos de dissolução irregular da pessoa jurídica
STJ – Continuação do julgamento da trava de 30% para compensação de prejuízos fiscais na extinção da empresa
STJ inicia o julgamento sobre a inclusão de serviços de capatazia no cálculo do valor aduaneiro
Lei nº 13.932/2019 – Extinção do adicional de 10% sobre o saldo do FGTS na demissão sem justa causa
PGFN lança primeiro edital de acordo de transação por adesão
CARF – Publicação do acórdão sobre o momento da incidência do PIS/Cofins de empresa de programa de fidelidade
Nossa equipe fica à disposição para esclarecimentos.
Boa leitura!
STF DECIDE SOBRE A CRIMINALIZAÇÃO DO ICMS DECLARADO E NÃO PAGO
Em 18 de dezembro de 2019, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) finalizou o julgamento do Recurso em Habeas Corpus (RHC) nº 163.334, que discute se a declaração do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sem o respectivo pagamento constituiria o crime tipificado no artigo 2º, inciso II, da Lei nº 8.137/1990.
O Tribunal entendeu, por maioria, que quando os contribuintes possuem a conduta reiterada e com dolo, isto é, intenção específica de se apropriar do valor não pago, há o cometimento do crime previsto no artigo 2º, inciso II, da Lei nº 8.137/1990. Assim, foi definida a tese, em regime de repercussão geral, nos seguintes moldes: “o contribuinte que, de forma contumaz e com dolo de apropriação, deixa de recolher o ICMS cobrado do adquirente da mercadoria ou serviço, incide no tipo penal do 2°, II, da Lei nº 8.137/90.”
Os Ministros que votaram a favor da criminalização da conduta, ancoraram-se, especialmente, no julgamento do RE 574.706, em que se decidiu que o valor do ICMS não é de propriedade do contribuinte, mas meramente transita na contabilidade da empresa, razão pela qual o não recolhimento do imposto configuraria apropriação indébita de valores de terceiros.
O Ministro Barroso, relator, destacou que não se estaria criminalizando o mero inadimplemento, mas sim a conduta contumaz com a comprovação do dolo específico, de modo a não atingir os “empresários honestos”.
Na prática, o julgamento pode gerar um movimento por parte do Ministério Público no sentido de intensificar ações contra os contribuintes sob o viés de denúncia por apropriação indébita, mesmo que as definições sobre a necessidade de comprovação do dolo e a configuração de uma conduta contumaz tenham sido estabelecidas no julgamento.
Nesse sentido, o posicionamento do Tribunal revela-se de especial interesse para os contribuintes, que devem acompanhar os desdobramentos desse julgamento, cuja decisão, provavelmente, ainda será objeto de recursos.
STJ – PUBLICAÇÃO DO ACÓRDÃO SOBRE O PRAZO PRESCRICIONAL PARA REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO FISCAL AOS SÓCIOS EM CASOS DE DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA PESSOA JURÍDICA
No dia 12 de dezembro de 2019, foi publicado o acórdão da 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) relativo ao julgamento do Recurso Especial (REsp) nº 1.201.993, no qual restou definida, pelo regime de recursos repetitivos, a sistemática de contagem do prazo prescricional para redirecionamento de execução fiscal de sócios ou gerentes, no caso de dissolução irregular de pessoa jurídica.
Em resumo, a controvérsia cingia-se à questão de saber-se se a regra do art. 174, parágrafo único, inciso I, do Código Tributário Nacional (CTN), seria apta a atrair a prescrição de execuções fiscais nos casos em que a pretensão de redirecionamento aos sócios ou gerentes fosse exercida pelo Fisco após cinco anos do despacho do juiz que ordenou a citação da pessoa jurídica dissolvida irregularmente (ou de sua citação pessoal, na redação anterior do dispositivo, modificada pela Lei Complementar nº 118/05).
Após intensos debates e diversas declarações de voto conflitantes, a questão restou resolvida da seguinte forma:
(i) nas hipóteses em que a dissolução irregular for anterior à diligência para citação da pessoa jurídica, o prazo de cinco anos para redirecionamento da execução fiscal conta-se da realização de tal diligência;
(ii) nas hipóteses em que se constatar a dissolução irregular após a ocorrência de citação do sujeito passivo original, o termo inicial do prazo prescricional para redirecionamento da execução fiscal aos sócios ou gerentes é “a data da prática de ato inequívoco indicador do intuito de inviabilizar a satisfação do crédito tributário já em curso de cobrança executiva, a ser demonstrado pelo Fisco”; e
(iii) a decretação da prescrição para o redirecionamento pressupõe, em qualquer hipótese, a demonstração da inércia da Fazenda Pública para a cobrança dos sócios ou gerentes pela satisfação do crédito tributário, no curso do prazo prescricional.
STJ – CONTINUAÇÃO DO JULGAMENTO SOBRE A LEGALIDADE DA TRAVA DE 30% PARA COMPENSAÇÃO DE PREJUÍZOS FISCAIS NA EXTINÇÃO DA EMPRESA
No dia 10/12/2019, a 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu continuidade ao julgamento do Recurso Especial (REsp) nº 1.805.925/SP, no qual se discute a legalidade da glosa de compensação de prejuízos fiscais e de bases de cálculo negativas da CSLL em montante superior a 30% do lucro do exercício – a chamada “trava de 30%” –, no momento de extinção da pessoa jurídica.
O julgamento havia sido paralisado, por pedido de vista, após voto do Ministro Relator, Napoleão Nunes Maia Filho, em que se negava provimento ao Recurso Especial da Fazenda Nacional, afastando-se tal limitação tal como havia sido determinado pelo acórdão recorrido, do Tribunal Regional Federal (TRF) da 3ª Região.
Em seu voto-vista, o Ministro Gurgel de Faria abriu divergência para dar provimento ao Recurso da Fazenda Nacional, para que fosse restabelecida a decisão de 1ª instância, que havia decidido no sentido da legitimidade da limitação da compensação em 30%.
Referido Ministro defendeu que tal compensação teria natureza de benefício fiscal e sua interpretação deveria, assim, ser restritiva, de modo que, como não há hipótese específica na lei tratando dos casos de extinção da pessoa jurídica, não se poderia afastar a limitação dos 30%. Alegou, ainda, que a 1ª e a 2ª Turmas do STJ tem precedentes no sentido de que a interpretação deve ser restritiva em casos que tratam de benefícios fiscais. O Ministro Sergio Kukina acompanhou seu voto na íntegra.
Por sua vez, a Ministra Regina Helena Costa acompanhou o voto do Ministro Relator, Napoleão Nunes Maia Filho, afastando a trava de 30% na hipótese de extinção da empresa. Em seu voto, sustentou que: (i) o STF ao julgar o Recurso Extraordinário nº 591.340, não adentrou as hipóteses em que há extinção da empresa; (ii) neste julgamento se trata de um quadro de impossibilidade lógica, pois não haverá mais exercício, após a extinção da empresa, para o aproveitamento dos prejuízos; e (iii) que a norma deve se adequar nos casos em que há extinção da pessoa jurídica.
Diante da ausência do Ministro Benedito Gonçalves, o julgamento restou empatado em 2 votos contra e 2 votos a favor da trava de 30% na extinção da empresa A questão deve voltar em pauta na primeira sessão da 1ª Turma do STJ em 2020, onde se definirá se tal limitação, deve ou não, ser imposta em casos de extinção da pessoa jurídica.
STJ INICIA O JULGAMENTO SOBRE A INCLUSÃO DE SERVIÇOS DE CAPATAZIA NO CÁLCULO DO VALOR ADUANEIRO
A 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) iniciou, no último dia 11 de dezembro, o julgamento dos Recursos Especiais (REsp) nº 1.799.306/RS, 1.799.308/SC e 1.799.309/PR, que discutem a inclusão de serviços de capatazia na base de cálculo do valor aduaneiro, sob o regime de recurso repetitivo (Tema 1.014).
O Ministro Relator, Gurgel de Faria, negou provimento aos Recursos da Fazenda Nacional, entendendo que os serviços de capatazia, que consistem na movimentação de mercadorias importadas nas instalações do porto, extrapolam os limites fixados no artigo 77, II, do Decreto 6.759/2009 e, por isso, não integram o valor aduaneiro.
De acordo com o Ministro Relator, o Decreto 6.759/2009 permite incluir no valor aduaneiro apenas “os gastos relativos à carga, à descarga e ao manuseio, associados ao transporte da mercadoria importada” até o porto alfandegário de destino. Como os serviços de capatazia ocorrem em momento posterior à importação, já nas instalações do porto de destino, não podem ser incluídos no valor aduaneiro.
O julgamento foi interrompido com o pedido de vistas do Ministro Francisco Falcão e ainda não tem data para retornar à pauta da 1ª Seção.
LEI Nº 13.932/2019 – EXTINÇÃO DO ADICIONAL DE 10% SOBRE O SALDO DO FGTS NA DEMISSÃO SEM JUSTA CAUSA
Em 12 de dezembro de 2019, foi publicada a Lei nº 13.932/2019, conversão da Medida Provisória nº 889/2019, que tem como um dos objetivos extinguir, a partir de 1º de janeiro de 2020, a cobrança do adicional de 10% sobre o montante de todos os depósitos devidos, referentes ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), durante a vigência do contrato de trabalho, acrescido das remunerações aplicáveis às contas vinculadas, devido pelos empregadores em caso de demissão sem justa causa.
Referido adicional, instituído pelo art. 1º da Lei Complementar (LC) nº 110/2001, foi criado para compensar as perdas de saldo das contas do FGTS causadas pelos expurgos inflacionários dos planos Verão (1989) e Collor I (1990), e vem sendo discutido pelos contribuintes no Judiciário em razão de sua inconstitucionalidade e ilegalidade.
A extinção não atinge os débitos anteriores a janeiro de 2020, mas reforça a tese de que a cobrança é abusiva. Atualmente, há discussão sobre a constitucionalidade da contribuição perante o Supremo Tribunal Federal (STF), no Recurso Extraordinário (RE) nº 878313, cuja repercussão geral foi reconhecida, sob o argumento de que (i) a base de cálculo prevista pela LC nº 110/2001 não encontra previsão na Constituição Federal após a Emenda Constitucional nº 33/01, e de que (ii) houve desvio de finalidade do tributo com a utilização dos valores arrecadados para outros fins.
Assim, com essa nova lei, os Tribunais pátrios terão mais respaldo jurídico para decidir favoravelmente aos contribuintes.
PGFN LANÇA PRIMEIRO “EDITAL DE ACORDO DE TRANSAÇÃO POR ADESÃO” DE DÉBITOS INSCRITOS EM DÍVIDA ATIVA DA UNIÃO
Foi publicado pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), no início de dezembro, o “Edital de Acordo de Transação por Adesão nº 01/2019”, que permite aos devedores com débitos inscritos na Dívida Ativa da União (DAU) transacionarem suas dívidas em condições especiais.
Mencionado Edital, publicado nos termos da autorização dada pela Medida Provisória nº 899/2019, destina-se às pessoas físicas e jurídicas que possuam débitos de até R$ 15 (quinze) milhões, e que se enquadrem em uma das modalidades abaixo:
(i) Débitos inscritos em DAU de pessoas jurídicas baixadas, inaptas ou suspensas no cadastro de pessoa jurídica, sem anotação atual de parcelamento, garantia ou suspensão por decisão judicial;
(ii) Débitos inscritos em DAU há mais de 15 (quinze) anos, sem anotação atual de parcelamento, garantia ou suspensão por decisão judicial;
(iii) Débitos inscritos em DAU que estejam suspensos por decisão judicial há mais de 10 (dez) anos; e
(iv) Débitos inscritos em DAU de pessoa natural falecida.
Os descontos oferecidos à adesão à transação de pessoas jurídicas podem chegar a 50% para a opção de pagamento em parcela única e o prazo de pagamento pode atingir 84 meses. No caso de devedor pessoa física, micro ou pequena empresa, o desconto pode atingir 70% e o prazo pode chegar a 100 meses. No caso de débitos previdenciários, o prazo máximo é de 60 meses. A aplicação de mencionados descontos, porém, não poderá resultar em redução do montante principal do débito inscrito em DAU.
A adesão poderá ser realizada até o dia 28 de fevereiro de 2020, obrigatoriamente por meio do portal “Regularize”, devendo-se observar os demais procedimentos estipulados no Edital para cada modalidade, conforme o caso.
Nota-se, porém, que mencionado edital restringiu bastante o universo de contribuintes que poderá dele se aproveitar, além de ter previsto modalidades que englobam débitos possivelmente já extintos por prescrição ou que sejam inexigíveis por qualquer outra razão. Recomenda-se, assim, que mesmo os contribuintes que se enquadrem em uma das modalidades de transação verifiquem cuidadosamente, caso a caso, a conveniência de se aderir à transação em tela.
CARF – PUBLICAÇÃO DO ACÓRDÃO SOBRE O MOMENTO DA INCIDÊNCIA DO PIS/COFINS DE EMPRESA DE PROGRAMA DE FIDELIDADE
A 1ª Turma Ordinária da 2ª Câmara da 3ª Seção de Julgamento do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), em recente julgado, decidiu que, na vigência do Regime Tributário de Transição (RTT), o PIS e a Cofins de empresa de fidelidade deve ser apurado no momento do recebimento da emissão dos pontos para os consumidores, quando ocorre o recebimento dos recursos das empresas parceiras, participantes do programa de pontos.
No caso em tela, a recorrente é empresa que desenvolve e gerencia de programa de fidelização de clientes, por meio de uma rede de coalizão ou multifidelização formado por diversas empresas parceiras, que se relacionam com a recorrente de acordo com regras estabelecidas em contratos de parceria.
A operação da contribuinte recorrente consiste em (i) emitir pontos de fidelidade para clientes das empresas parceiras, mediante o recebimento, de tais parceiras, dos valores em dinheiro correspondentes a tais pontos; e, em momento posterior, (ii) converter tais pontos em produtos ou serviços oferecidos por empresas parceiros, quando da utilização dos pontos previamente emitidos pelos clientes, pagando diretamente às parceiras por tais produtos ou serviços.
Nesse cenário, o procedimento utilizado pela recorrente para o reconhecimento de suas receitas era o seguinte: (i) no momento da emissão dos pontos, a empresa de fidelidade registrava os valores recebidos de suas parceiras em seu passivo, em conta de receita diferida; e (ii) no momento dos resgates ou vencimento dos pontos, reconhecia as receitas obtidas pelo valor consistente na diferença entre o valor recebido de suas parceiras e o custo para aquisição dos produtos ou serviços solicitados pelos clientes (que, no caso do vencimento dos pontos, era zero), oferecendo tais valores à tributação pelo PIS e pela Cofins.
A empresa de fidelidade foi autuada pelo fato de a Fiscalização entender que o momento de reconhecimento de suas receitas deveria ser o do recebimento dos recursos de suas parceiras (emissão dos pontos), e não o da conversão dos pontos em produtos.
A contribuinte alegou que, no momento do recebimento dos recursos, não ocorre propriamente uma venda de pontos de fidelidade apta a atrair a incidência do PIS e da Cofins, mas sim uma assunção, pela empresa de fidelidade, de dívida das empresas parceiras para com seus clientes. Ademais, afirmou que não é possível, no momento da emissão, saber o custo dos produtos que serão adquiridos como resultado da conversão dos pontos e, portanto, pelo princípio da competência, a receita somente poderia ser reconhecida quando tal custo, de fato, se materializasse, pois sendo o custo o esforço financeiro necessário para a obtenção de suas receitas, deve ele ser reconhecido concomitantemente à respectiva receita. Por fim, alegou a recorrente que tal prática estaria em consonância com as normas do Pronunciamento Técnico CPC nº 30 (CPC 30).
A Turma Julgadora, no entanto, entendeu que, tratando-se de fatos geradores ocorridos em 2012, estava vigente à época o RTT e que, portanto, os novos critérios contábeis introduzidos pelo CPC 30 não poderiam ter efeitos tributários.
Nos termos do voto do Conselheiro Relator, o fato de os custos dos produtos objeto da conversão de pontos não serem conhecidos na época da emissão não autorizaria a recorrente a postergar o reconhecimento de suas receitas. Ao contrário, deveria ela reconhecer a receita no momento da emissão e, com base em estimativas estatísticas, constituir provisão relativa a tais custos (Acórdão nº 3201-006.137).