Impactos e oportunidades advindos da Lei nº 14.973/2024
Foi publicada no último dia 16 a Lei nº 14.973/2024, que prevê:
(i) O fim gradual da Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta (CPRB) para determinados setores da economia, bem como, no mesmo período, do adicional da alíquota do Cofins-Importação;
(ii) Possibilidade de atualização do valor de bens imóveis por pessoas físicas e jurídicas, ao custo de 4% e 10%, respectivamente;
(v) Medidas de combate à fraude no pagamento de benefícios previdenciários;
(vi) Nova regulamentação sobre depósitos realizados em processos administrativos ou judiciais em que seja parte a União, qualquer de seus órgãos, fundos, autarquias, fundações ou empresas estatais federais, determinando o imediato repasse à Conta Única do Tesouro e retirando a correção dos depósitos pela taxa SELIC em caso de levantamento pelo depositante;
(vii) Obrigatoriedade de apresentação da Declaração de Incentivos, Renúncias, Benefícios e Imunidades de Natureza Tributária (Dirbi);
Para maiores informações a respeito de cada um dos temas, basta clicar sobre os respectivos links ou entrar em contato com o time Baruel Barreto Advogados.
I. Extinção gradual da CPRB e do adicional de 1% da Cofins-Importação
A contribuição substitutiva vigorará plenamente até dezembro de 2024. A partir de 2025, os setores beneficiados pela desoneração que assim optarem, poderão recolher também a contribuição previdenciária sobre a folha de salários (CPFS), nos seguintes termos:
Ano-calendário 2025: 80% das alíquotas da CPRB estabelecidas nos arts. 7º-A e 8º-A da Lei nº 12.546/2011 e 25% das alíquotas regulares da CPFS;
Ano-calendário 2026: 60% das alíquotas da CPRB estabelecidas nos arts. 7º-A e 8º-A da Lei nº 12.546/2011 e 50% das alíquotas regulares da CPFS; e
Ano-calendário 2027: 40% das alíquotas da CPRB estabelecidas nos arts. 7º-A e 8º-A da Lei nº 12.546/2011 e 75% das alíquotas regulares da CPFS.
As empresas que optarem pela sistemática acima não recolherão as contribuições sobre a parcela paga, devida ou creditada a título de décimo terceiro salário.
A possibilidade de recolher a contribuição previdenciária sobre a receita bruta em substituição à CPFS será extinta a partir do ano-calendário de 2028.
Ao mesmo tempo em que haverá a extinção gradativa da CPRB, haverá a extinção do adicional de 1% da alíquota da Cofins-Importação. Na redação anterior, tal adicional vigoraria até 2027, mas com a nova regra a alíquota será de 0,8% em 2025, 0,6% em 2026 e de 0,4% em 2027.
II. Atualização do custo de bens imóveis
A Lei nº 14.973/2024 criou a possibilidade de a pessoa física residente no Brasil promover a atualização do valor de bens imóveis já declarados, com uma tributação do IRPF à alíquota de 4% sobre a atualização.
As pessoas jurídicas, por sua vez, também poderão atualizar o custo de bens imóveis registrados em seu ativo permanente, recolhendo o IRPJ e CSLL sobre essa atualização pelas alíquotas de 6% e 4%, respectivamente. No entanto, o custo atualizado não poderá ser considerado para fins de apuração de despesa de depreciação.
O aproveitamento integral do custo atualizado na forma da Lei nº 14.973/2024 somente será aplicado na apuração de ganho de capital sobre vendas realizadas após decorridos 15 anos da atualização (i.e. ano calendário de 2039). Para as vendas realizadas antes de decorridos 15 anos da atualização, o custo atualizado deverá ser reduzido mediante multiplicação pelos seguintes percentuais:
Com relação a essa oportunidade, destacamos dois pontos:
a) segundo nossas contas, a alíquota combinada de 4% e alíquota efetiva sobre o ganho de capital, ainda que consideradas as reduções acima, passam a ser vantajosas em relação a vendas realizadas após 6 anos (i.e., 72 meses) da atualização; e
b) a redação do parágrafo único do art. 8º prevê que o percentual de redução do ganho é aplicado em relação à data da venda do bem imóvel, e não em outras formas de alienação. Essa redação pode gerar a interpretação de que a integralização do imóvel em pessoa jurídica, ou qualquer outra forma de alienação que não seja venda, não é considerada para fins de aplicação dos percentuais de redução.
Por fim, a opção pela atualização e recolhimento dos tributos devidos devem ser realizados até 15/12/2024, prazo de noventa dias contados a partir da data de publicação da Lei nº 14.973/2024.
III. Novo RERCT-Geral
A Lei nº 14.973/2024 instituiu o Regime Especial de Regularização Geral de Bens Cambial e Tributária (RERCT-Geral), para declaração voluntária de recursos, bens ou direitos de origem lícita, não declarados ou declarados com omissão ou incorreção em relação a dados essenciais, mantidos no Brasil ou no exterior, ou já repatriados por residentes ou domiciliados no País, conforme a legislação cambial ou tributária.
A adesão ao RERCT-Geral deve ser realizada até 15/12/2024, do mesmo modo que a atualização de bens imóveis detalhada acima, e será formalizada por meio de a Declaração de Regularização Cambial e Tributária (“Dercat"), conforme regulamentação dada pela Receita Federal, por meio da Instrução Normativa nº 2.221/2024, publicada em 20/09/2024.
A adesão ao RERCT-Geral está condicionada ao pagamento de IRPF à alíquota de 15% sobre o valor total dos recursos regularizados e multa de 100% do valor do imposto, cujo prazo também será 15/12/2014.
Somente poderão ser regularizados bens existentes em data anterior a 31/12/2023, detidos por contribuintes residentes ou domiciliados no País até a referida data.
Algumas observações importantes sobre o RERCT-Geral:
a) Por opção legislativa, não se aplica ao RERCT-Geral o art. 11 da Lei nº 13.254/2016, que afastava os benefícios do RERCT dos “detentores de cargos, empregos e funções públicas de direção ou eletivas, nem ao respectivo cônjuge e aos parentes consanguíneos ou afins, até o segundo grau ou por adoção;”
b) No que tange à origem lícita dos recursos, a Lei nº13.973/2024 estabelece que “é da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, em qualquer tempo, o ônus da prova para demonstrar que é falsa a declaração prestada pelo contribuinte”;
c) Nas adesões de que trata essa Lei, a Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil apenas poderá intimar o optante do RERCT a apresentar documentação se houver a demonstração da presença de indícios ou outros elementos diversos da declaração prestada pelo contribuinte suficientes à abertura de expediente investigatório ou procedimento criminal, sob pena de nulidade.
IV. Aperfeiçoamento dos mecanismos de transação e cobrança de dívidas com as autarquias e fundações públicas federais e outras
O art. 19 da Lei nº 14.973/2024 alterou a Lei nº 13.988/2020 (Lei da transação tributária) para:
(i) Incluir o art. 22-B, estabelecendo regras de transação da dívida ativa das autarquias e das fundações públicas federais cujas inscrição, cobrança e representação incumbam à Procuradoria-Geral Federal (PGF) e à Procuradoria-Geral do Banco Central e aos créditos cuja cobrança seja competência da Procuradoria-Geral da União, cuja disciplina compete ao Advogado-Geral da União;
(ii) Incluir o art. 22-C, prevendo que a PGF poderá propor aos devedores transação na cobrança da dívida ativa das autarquias e fundações públicas federais, de natureza não tributária, quando houver relevante interesse regulatório previamente reconhecido por ato do Advogado-Geral da União;
(iii) Incluir o art. 22-D, prevendo que a PGF poderá propor a transação de forma individual ou por adesão, sempre que, motivadamente, entender que a medida atende ao interesse público, vedada a apresentação de proposta de transação individual pelo devedor, aplicando-se as reduções a créditos que consistirem em multa decorrente de processo administrativo sancionador.
O art. 20 da Lei nº 14.973/2024 alterou a Lei do CADIN, para permitir a inclusão em tal cadastro dos débitos (i) inscritos na dívida dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; (ii) inscritos na dívida ativa de autarquias profissionais e conselhos de classe; e (iii) perante o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).
Mais um ponto importante veiculado pelo art. 20 se refere à possibilidade de se estabelecer convênio entre a União e os Estados, Munícipios, Distrito Federal, bem como autarquias profissionais e conselhos de classe, estabelecendo regras de cooperação que favoreçam a recuperação desses ativos.
V. Medidas de combate à fraude no pagamento de benefícios previdenciários
A Lei nº 14.973/2024 estabeleceu que o INSS poderá adotar medidas cautelares visando a conter gastos e prejuízos no pagamento de benefícios por ele administrados, decorrentes de irregularidades ou fraudes, com objetivo assegurar a efetividade dos direitos sociais e a sustentabilidade financeira da previdência e da assistência social, dentre as quais:
a) Exigir do requerente do benefício de prestação continuada, ou ao responsável legal, registro biométrico nos cadastros da Carteira de Identidade Nacional (CIN), do título eleitoral ou da Carteira Nacional de Habilitação (CNH), nos termos de ato conjunto dos órgãos competentes;
b) Os registros do CadÚnico desatualizados há mais de 36 (trinta e seis) meses, referentes a beneficiários com renda acima de meio salário mínimo mensal per capita que não sejam público de benefícios sociais concedidos pelo governo federal, poderão ser excluídos da base nacional do CadÚnico, por ato do Poder Executivo.
Ainda, a referida Lei determina que, nos termos de regulamento do Poder Executivo, a adimplência dos entes federados relativa ao envio de dados cadastrais ao Sistema de Escrituração Digital das Obrigações Fiscais, Previdenciárias e Trabalhistas (eSocial) é condição: (i) para a compensação financeira de que trata o § 5º do art. 6º da Lei nº 9.796, de 5 de maio de 1999; e (ii) para a aplicação do § 17 do art. 22 da Lei nº 8.212/1991, que prevê a redução de alíquotas para os municípios com coeficientes inferiores a 4,0 da tabela de faixas de habitantes do CTN.
VI. Nova regulamentação sobre depósitos realizados em processos administrativos ou judiciais em que seja parte a União
A Lei nº 14.973/2024 revogou a Lei nº 9.703/1998 e trouxe nova disciplina a respeito dos depósitos realizados em processos administrativos ou judiciais em que figure a União, qualquer de seus órgãos, fundos, autarquias, fundações ou empresas estatais federais dependentes.
Dentre as principais alterações, destacamos:
a) Todos os depósitos deverão ser realizados perante a Caixa Econômica Federal, que promoverá o depósito diretamente na Conta Única do Tesouro Nacional, comunicando eletronicamente a Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, do Ministério da Fazenda;
b) Não havendo a imediata transferência dos valores à Conta Única do Tesouro pela Caixa Econômica Federal, os recursos depositados serão submetidos à remuneração pela SELIC desde a inobservância do repasse obrigatório;
c) A Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, do Ministério da Fazenda, centralizará os dados relativos aos depósitos, devendo a instituição financeira manter controle dos valores depositados, devolvidos, levantados e concluídos, ficando responsável pelos registros e extratos dos depósitos;
d) Destinação dos depósitos: por ordem da autoridade competente: (i) haverá a conclusão da conta de depósito sem a incidência de remuneração, quando os valores forem destinados à administração pública; ou (ii) haverá o levantamento dos valores por seu titular, acrescidos de correção monetária por índice oficial que reflita a inflação (IPCA ao invés da SELIC).
A lei tem vigência imediata (art. 50) e o Ministro da Fazenda disporá sobre questões procedimentais necessárias à execução do disposto no Capítulo VI (art. 38). Antes do ato do Ministro, continuam sendo aplicadas as regras procedimentais antigas (art. 40 da lei).
Dessa maneira, embora ainda estejam pendentes regras para novos depósitos (código de receita, guia, etc.), a regra já é válida e os depósitos feitos na vigência da lei já se submetem a ela, deixando de ser remunerados pela taxa SELIC, o que, em nosso entender, é passível de questionamentos por violar, por exemplo, a isonomia entre União e contribuintes.
Quanto aos depósitos realizados antes de 16/09/2024, mantém-se as regras antigas quanto à remuneração pela SELIC, sendo ônus da Caixa fazer a transferência à Conta Única do Tesouro.
VII. Declaração de Benefícios Fiscais - DIRBI
A DIRBI foi inicialmente instituída pela Medida Provisória nº 1.227/2024, que deveria ser votada aprovada pelo Congresso Nacional até 01/10/2024 Com o esvaziamento da Medida Provisória nº 1.227/2024, tal matéria foi inserida no bojo do Projeto de Lei nº 1.847/2024, que culminou na Lei nº 14.973/2024.
A Lei determina que a pessoa jurídica que usufruir de benefício fiscal deverá informar na DIRBI os incentivos, as renúncias, os benefícios ou as imunidades de natureza tributária de que usufruir, bem como o valor do crédito tributário correspondente.
Para estabelecer os benefícios, os termos e os prazos, a Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil editou a Instrução Normativa nº RFB nº 2.198/2024, estabelecendo sua entrega mensal em relação a diversos benefícios, tais como PERSE, RECAP, REIDI, REPORTO, CPRB, PADIS, REIQ, SUDAM e SUDENE, dentre outros.
A falta de apresentação ou apresentação em atraso da DIRBI está sujeita às seguintes multas, calculada por mês ou fração:
0,5% sobre a receita bruta de até R$ 1.000.000,00;
1% sobre a receita bruta de R$ 1.000.000,01até R$ 10.000.000,00; e
1,5% (um inteiro e cinco décimos por cento) sobre a receita bruta acima de R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais).
Em qualquer caso, a multa não poderá ser superior a 30% do valor dos benefícios fiscais usufruídos.
VIII. Destinação de recursos esquecidos em instituições financeiras
O art. 45 da Lei nº 14.973/2024 prevê que os recursos existentes nas contas de depósitos, sob qualquer título, cujos cadastros não foram objeto de atualização, somente poderão ser reclamados junto às instituições depositárias até 15/10/2024, sob pena de passarem ao domínio da União e apropriados pelo Tesouro Nacional como receita orçamentária primária.
Uma vez que os saldos não reclamados remanescentes forem apropriados pelo Tesouro Nacional, o Ministério da Fazenda providenciará a publicação, no Diário Oficial da União, de edital que relacionará os valores recolhidos, indicará a instituição depositária, a agência e a natureza e o número da conta do depósito e estipulará prazo de 30 (trinta) dias, contado da data de sua publicação, para que os respectivos titulares contestem o recolhimento efetuado. O prazo para contestação judicial também é exíguo (apenas 6 meses da publicação do Edital).