Governo edita Medida Provisória com novas regras de tributação de rendimentos e ativos no exterior pelo IRPF e atualizando a tabela mensal do imposto

No último dia 30.04.2023, foi publicada na edição extra do Diário Oficial da União (DOU) a Medida Provisória nº 1.171 (MP 1.171/2023), que trouxe nova regulamentação para a cobrança do IRPF sobre rendimentos e ativos do exterior.

O Governo Federal argumenta que a medida tem como objetivo implementar a regra de tributação já adotada por países desenvolvidos, como Alemanha, Canadá, Japão e França, além de seguir a recomendação da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) sobre o tema.

Novas regras aplicáveis à tributação de ganhos de capital rendimentos auferidos no exterior

Em suma, a MP nº 1.171/2023 acabou com a possibilidade de diferir a tributação sobre o ganho de capital e rendimentos detidos no exterior, mediante o uso de companhia holding offshore ou de fundos investimento exclusivos no exterior; regulamentou a tributação de rendimentos de trusts constituídos no exterior; instituiu a possibilidade de atualização do custo de aquisição de ativos no exterior e ainda atualizou a tabela do IRPF sobre rendimentos tributáveis em geral, sujeitos ao ajuste anual.

De acordo com a nova norma, que entrará em vigor a partir do ano de 2024 - por previsão expressa e por conta do princípio da anterioridade anual -, os rendimentos de i. aplicações financeiras; ii. entidades controladas no exterior; e iii. trusts no exterior ficarão sujeitos à tributação exclusiva, em separado dos demais rendimentos tributáveis, pela seguinte tabela progressiva própria:

Rendimento                                                                                                    Alíquota

Até R$ 6.000,00                                                                                                   0%

De R$ 6.000,00 a R$ 50.000,00                                                        15%

Acima de R$ 50.000,00                                                                             22,5%

Os rendimentos de aplicações financeiras serão tributados pelo regime de caixa, de modo que o IRPF só será devido no período de apuração em que os rendimentos forem efetivamente percebidos pela pessoa física, no resgate, na amortização, na alienação, no vencimento ou na liquidação das aplicações financeiras.

Já os rendimentos de companhias holding ou de fundos investimento e quaisquer outras entidades localizadas no exterior e controladas por pessoa física residente no Brasil, a tributação ocorrerá por presunção de disponibilidade econômica, de modo que os lucros auferidos pelas entidades estrangeiras deverão ser reconhecidos em 31 de dezembro de cada ano e oferecidos à tributação pelo IRPF, pela tabela progressiva acima, no mesmo período em que forem apurados.

Note que a tributação por presunção de disponibilidade econômica se aplicará somente aos ativos que sejam controlados, direta ou indiretamente, isoladamente ou em conjunto com pessoas ligadas, por pessoa física residente no Brasil, e:

  1.  Constituam veículos de investimento, com renda ativa própria inferior a 80% da renda total; ou

  2.  Estiverem localizados em paraíso fiscal ou sejam beneficiários de regime fiscal privilegiado.

Ressaltamos que haverá limitação para aproveitamento de prejuízos fiscais, pois apenas será permitida a dedução dos prejuízos posteriores a 01.01.2024 e anteriores à data da apuração dos lucros a compensar.

Os rendimentos dos demais investimentos em entidades estrangeiras devem observar a nova regra geral de tributação, seguindo o regime de caixa, com tributação exclusiva e tabela progressiva própria no momento do efetivo recebimento.

Os rendimentos de trusts no exterior também devem ser tributados em separado dos demais rendimentos, pela tabela progressiva acima, sendo que o IRPF será considerado devido no momento da distribuição do rendimento pelo trust para o beneficiário ou do falecimento do instituidor, o que ocorrer primeiro.

Vale ressaltar que a MP nº 1.171/2023 é a primeira norma brasileira com força de lei a regulamentar a tributação dos rendimentos de trusts, assunto inédito no ordenamento jurídico brasileiro até o momento.

No passado, a Receita Federal do Brasil (RFB) havia se manifestado pela incidência de IRPF sobre rendimentos de trusts, pela tabela progressiva aplicável aos rendimentos tributáveis em geral (até 27,5%), dada a ausência de norma específica, conforme consta da Solução de Consulta COSIT nº 41/2020.

Mais recentemente, a Secretaria de Fazenda de São Paulo (SEFAZ/SP) emitiu a Resposta à Consulta Tributária 25.343/2023, por meio da qual sustentou que os rendimentos recebidos de trust são considerados doação, entendimento positivado pela MP nº 1.171/2023. Ou seja, em determinadas situações, é possível que ocorra a exigência tanto o IRPF quanto o ITCMD sobre os rendimentos de trusts localizados no exterior, o que poderia ser questionado.

Atualização de custo dos bens e direitos no estrangeiro

Quanto à possibilidade de atualização do valor de custo dos bens e direitos localizados no exterior, inclusive os objeto de trust, a diferença entre o custo histórico e o valor de mercado atual será tributada pela alíquota de 10% (dez por cento) e o IRPF deve ser recolhido até 30/11/2023.

Trata-se de opção que pode ser ser exercida pela pessoa física que deseje aumentar o valor de custo de seus bens e direitos no exterior, para evitar uma tributação mais onerosa em caso de futura alienação de tais bens e direitos, considerando que as alíquotas de IRPF sobre o ganho de capital na alienação de bens e direitos variam de 15% a 22,5% sobre o valor do ganho.

Tal opção se aplica bens ou direitos que sejam declarados na Declaração de Ajuste Anual relativa ao ano-calendário de 2022, entregue até o dia 31 de maio de 2023, e não se aplica a (i) bens ou direitos que tiverem sido alienados, baixados ou liquidados anteriormente à data da formalização da opção; e (ii) joias, pedras e metais preciosos, obras de arte, antiguidades de valor histórico ou arqueológico, animais de estimação ou esportivos e material genético de reprodução animal, sujeitos a registro em geral, ainda que em alienação fiduciária.

Especificamente no caso de controladas no exterior, a pessoa física que tiver optado pela atualização até 31 de dezembro de 2022 poderá optar, separadamente, por atualizar o valor de mercado para o período de 1º de janeiro de 2023 a 31 de dezembro de 2023, com pagamento do IRPF pela alíquota definitiva de 10% (dez por cento), o qual deve ser pago até 31 de maio de 2024.

Atualização da tabela progressiva mensal do IRPF

Ademais, houve correção da tabela progressiva mensal do IRPF sobre os rendimentos tributáveis sujeitos ao ajuste anual, inclusive aqueles pagos por fontes pagadoras localizadas no Brasil, válida imediatamente, ou seja, para rendimentos auferidos a partir deste mês de maio de 2023, conforme abaixo:

Base de cálculo (mensal)                                            Alíquota                               Parcela a deduzir (R$)

Até R$ 2.112,00                                                                                       0%                                                    Zero

De R$ 2.112,01 a R$ 2.826,65                                                   7,5%                                                    158,40

De R$ 2.826,66 a R$ 3.751,05                                               15%                                                     370,40

De R$ 3.751,06 a R$ 4.664,68                                             22,5%                                                     651,73

Acima de R$ 4.664,68                                                                27,5%                                                     884,96

Ganhos na condição de não residente

Por fim, vale salientar que passa a ser exigido o IRPF sobre os ganhos auferidos na alienação, liquidação ou resgate de bens ou direitos no exterior, adquiridos na condição de não-residente, por revogação da norma que previa a não incidência do imposto, contida no inciso I do § 6º do art. 24 da Medida Provisória nº 2.158-35/2001.

Vale lembrar que as medidas provisórias devem ser votadas e aprovadas pelo Congresso Nacional, dentro do prazo de 60 dias contados de sua publicação, prorrogáveis por igual prazo, para que sejam convertidas em lei e, com isso, sejam definitivamente incorporadas ao ordenamento jurídico.

Apesar da possibilidade de alteração do texto proposto pela MP nº 1.171/2023 durante a sua apreciação pelo Congresso, o contribuinte que detiver ativos no exterior deve buscar aconselhamento jurídico para rever suas estruturas de investimento.

A nossa equipe está à disposição para esclarecer dúvidas a respeito do assunto.

Anterior
Anterior

JOTA - IRPJ e CSLL sobre a Selic: reflexões à luz do recente julgado da 1ª Seção do STJ

Próximo
Próximo

Boletim Tributário - Abril de 2023