Estado de São Paulo sanciona lei com importantes alterações nas regras de transação da Dívida Ativa estadual
O governador do Estado de São Paulo sancionou, em 07/11/2023, a Lei nº 17.843, que dispõe sobre a transação de créditos de natureza tributária ou não tributária, inscritos em Dívida Ativa, para o fim de resolução de litígios relativos à cobrança de créditos da Fazenda Pública.
De forma semelhante à Lei Federal nº 13.988/2020 - que estabelece a transação no âmbito da União e de suas autarquias e fundações -, a referida lei estadual traz a moldura normativa contendo os requisitos e condições para que o Estado de São Paulo, suas autarquias e outros entes estaduais, cuja representação incumba à Procuradoria Geral do Estado (PGE), realizem transação com devedores de créditos inscritos na Dívida Ativa estadual.
Vale mencionar que a Lei Estadual nº 17.293/2020 já havia trazido, nos artigos 41 a 56, regras gerais acerca da transação no âmbito da PGE. No entanto, a nova Lei revoga expressamente tais artigos e traz um maior detalhamento ao instituto, além de ampliar sobremaneira a abrangência e os benefícios possíveis em termos de reduções e prazos, e estabelecer modalidades especiais de transação.
Confira, a seguir, os principais aspectos da nova regulamentação.
Modalidades previstas
Dentro de seu juízo de conveniência e oportunidade, os referidos entes públicos poderão celebrar transação em quaisquer das modalidades previstas na lei, quais sejam:
I - por adesão, nas hipóteses em que o devedor ou a parte adversa aderir aos termos e condições estabelecidos em edital publicado pela PGE;
II - por proposta individual ou conjunta de iniciativa do devedor ou do credor.
A transação por adesão é a modalidade que implica na aceitação de todas as condições fixadas no respectivo edital, que especificará as hipóteses fáticas e jurídicas nas quais ela é admissível, abertas a todos os devedores que nelas se enquadrem e que satisfaçam às condições previstas na Lei e no edital.
A transação por proposta individual ou conjunta, por sua vez, é a modalidade de transação em que poderão ser negociados entre credor e devedor os meios para a extinção dos créditos nela contemplados e estará condicionada, no mínimo, à assunção pelo devedor dos compromissos previstos nos incisos do artigo 3º da Lei nº 17.843/2023, dentre os quais destacamos:
desistência de impugnações ou recursos que discutam os débitos incluídos na transação;
renúncia a quaisquer alegações de direito, atuais ou futuras, sobre as quais se fundem ações judiciais, inclusive as coletivas, ou recursos que tenham por objeto os créditos incluídos na transação, por meio de requerimento de extinção do respectivo processo com resolução de mérito; e
dever de peticionamento nos processos judiciais que tenham por objeto as dívidas envolvidas na transação, inclusive em fase recursal, para noticiar a celebração do ajuste, informando o devedor, expressamente, que arcará com o pagamento da verba honorária devida a seus patronos e com as custas incidentes sobre a cobrança.
Benefícios possíveis:
Conforme a lei, a transação poderá contemplar, isolada ou cumulativamente:
concessão de descontos nas multas, nos juros e nos demais acréscimos legais, inclusive honorários, relativos a créditos a serem transacionados que sejam classificados como irrecuperáveis ou de difícil recuperação, limitada a 65% do valor total transacionado (ou a 70% em caso de pessoa natural, microempresa ou empresa de pequeno porte);
oferecimento de prazos e formas de pagamento especiais, limitados ao prazo máximo de quitação de até 120 meses (ou a 145 meses em caso de pessoa natural, microempresa ou empresa de pequeno porte);
oferecimento, a substituição ou a alienação de garantias e de constrições;
utilização de créditos acumulados e de ressarcimento do ICMS, ICMS/ST e créditos de produtor rural;
utilização de créditos líquidos, certos e exigíveis, próprios ou adquiridos de terceiros, consubstanciados em precatórios decorrentes de decisões judiciais transitadas em julgado e não mais passíveis de medida de defesa ou desconstituição.
Efeitos da transação e outras disposições gerais
O deferimento da proposta de transação importa em aceitação integral dos termos da referida Lei e a confissão irrevogável dos créditos abrangidos pela transação, nos termos dos artigos 389 a 395 do Código de Processo Civil (CPC).
A lei também estabelece que eventuais valores depositados em juízo ou penhorados para garantia dos débitos incluídos na transação devem ser ofertados no termo de acordo para que sejam abatidos do valor líquido do débito.
Dispõe, ainda, que a realização da transação não autoriza a restituição ou compensação de valores pagos, compensados ou incluídos em parcelamentos anteriormente pactuados.
A proposta da transação não suspende a exigibilidade dos créditos e nem o andamento das execuções. No entanto, quando a transação restar devidamente formalizada e envolver moratória ou parcelamento, será aplicável o artigo 151 do CTN, que estabelece a suspensão da exigibilidade do crédito tributário objeto de moratória (inciso I) ou parcelamento (inciso VI).
Modalidades especiais de transação por adesão
Transação por Adesão no Contencioso Tributário de Relevante e Disseminada Controvérsia Jurídica
A Lei nº 17.843/2023 prevê a possibilidade de que o Estado de São Paulo proponha transação por adesão direcionada aos devedores com litígios tributários decorrentes de relevante e disseminada controvérsia jurídica.
A proposta de transação em tal modalidade deverá, preferencialmente, versar sobre controvérsia restrita a segmento econômico ou produtivo, a grupo ou universo de contribuintes ou a responsáveis delimitados, vedada, em qualquer hipótese, a alteração de regime jurídico tributário.
O edital conterá as exigências a serem cumpridas, as reduções ou concessões oferecidas, bem como os prazos e as formas de pagamento admitidas.
Ademais, somente será celebrada se constatada a existência, na data de publicação do edital, de inscrição em dívida ativa, de ação judicial, de embargos à execução fiscal ou de exceção de pré-executividade pendente de julgamento definitivo, relativamente à tese objeto da transação; e deverá abranger todos os litígios relacionados à tese objeto da transação existentes na data do pedido, ainda que não definitivamente julgados.
Transação por Adesão no Contencioso de Pequeno Valor
Também há previsão na Lei nº 17.843/2023 de transação por adesão no contencioso de pequeno valor, para casos em que o valor não superar o limite de alçada fixado para ajuizamento da execução fiscal, estabelecido em ato do Procurador Geral do Estado.
Em tal modalidade, poderão são incluídos débitos inscritos em dívida ativa há mais de 2 (dois) anos na data de publicação do edital, e a transação poderá contemplar reduções de multa, juros e demais acréscimos legais, inclusive honorários, observado o limite máximo de 50% do valor total do crédito, e oferecer prazo máximo de quitação de 60 meses.
A proposta poderá ser condicionada à homologação judicial do acordo.
Transação por adesão acerca dos juros de mora superiores à taxa Selic
A Lei desde já instituiu a modalidade excepcional de transação por Adesão no Contencioso Tributário de Relevante e Disseminada Controvérsia relativamente aos juros de mora incidentes sobre os débitos inscritos em dívida ativa e decorrentes da aplicação das Leis nº 13.918/2009 e nº 16.497/2017.
A referida lei de 2009 instituiu a malfadada taxa de juros de mora de 0,13% (treze décimos por cento) ao dia - que restou declarada inconstitucional pelo Órgão Especial do TJSP -, e a mencionada lei de 2017 alterou tal taxa, a qual passou a equivaler à taxa SELIC acrescida de 1%, alinhando-se à jurisprudência firmada no sentido da limitação dos juros de mora ao patamar fixado para os créditos da União (que utiliza a taxa SELIC).
O contribuinte poderá aderir livremente a tal modalidade sempre que possuir débitos inscritos em dívida ativa contemplando a incidência de juros de mora calculados conforme as citadas leis, sendo atribuídos os benefícios de:
desconto de 100% dos juros de mora;
deduzidos os juros de mora, desconto de 50% da totalidade do débito remanescente, incluindo multas de quaisquer espécies, juros e encargos legais, desde que não implique redução do principal do imposto; e
parcelamento em 120 meses.
Por fim, a lei estabele que o regulamento poderá disciplinar a aplicação da taxa Selic aos juros de mora aos créditos inscritos em Dívida Ativa, independentemente da data de inscrição.