Boletim Tributário - Outubro de 2021
Temos o prazer de apresentar, a seguir, a edição de outubro de 2021 de nosso Boletim Tributário, informativo mensal com o objetivo de divulgar novidades legislativas e jurisprudenciais em matéria tributária.
Nesta edição, apresentamos os seguintes assuntos:
Sancionada lei complementar que prorroga isenções e benefícios fiscais setoriais de ICMS por 15 anos
STF decide que contrato de parceria entre salões e profissionais de beleza é constitucional
Sefaz/SP aplica entendimento do STF sobre não incidência de ICMS sobre softwares
Nossa equipe fica à disposição para esclarecimentos.
Boa leitura!
SANCIONADA LEI COMPLEMENTAR QUE PRORROGA ISENÇÕES E BENEFÍCIOS FISCAIS SETORIAIS DE ICMS POR 15 ANOS
O Presidente da República sancionou a Lei Complementar (LC) nº 186, de 27/10/2021, que altera a LC nº 160/2017, prorrogando por 15 (quinze) anos as isenções e os benefícios fiscais referentes ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), concedidos pelos Estados e Distrito Federal aos setores de comércio atacadista, às empresas que desenvolvem atividades portuárias e aeroportuárias e aos comerciantes e transportadores interestaduais de produtos agropecuários e extrativos vegetais in natura.
A vigência dos incentivos fiscais terminaria em dezembro de 2022 se a nova lei não fosse sancionada.
A referida lei sancionada também estabelece redução gradual de 20% (vinte por cento) das isenções e benefícios fiscais a partir de 1° de janeiro do 12º ano posterior à fruição dos efeitos dos referidos benefícios.
STF JULGARÁ A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA MULTA ISOLADA NO INDEFERIMENTO DE DECLARAÇÕES DE COMPENSAÇÃO E PEDIDOS DE RESSARCIMENTO
O Supremo Tribunal Federal (STF) pautou, para o dia 18/11/2021, o julgamento em conjunto do Recurso Extraordinário (RE) nº 796.939 (Tema nº 736 da Repercussão Geral) e da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4905, no bojo dos quais se discute a (in)constitucionalidade do artigo 74, parágrafos 15 e 17, da Lei 9.430/96, que prevê a aplicação de multa isolada no caso de não homologação de declaração de compensação e/ou indeferimento de pedido de ressarcimento, ainda que parciais, de créditos declarados pelo contribuinte à Receita Federal do Brasil.
O RE que será analisado foi interposto pela União contra acórdão do TRF da 4ª região, que definiu, em suma, na hipótese de não haver evidência de que o contribuinte tenha agido de má-fé, "as penalidades dos parágrafos 15 e 17 do art. 74 da lei 9.430, de 1996, conflitam com o disposto no artigo 5º, inciso XXXIV, alínea 'a' da Constituição", uma vez que tendem a inibir a iniciativa dos contribuintes de buscarem junto ao Fisco a devolução de valores indevidamente recolhidos, afrontando também o princípio da proporcionalidade.
Os julgamentos do RE e ADI serão realizados em sessão plenária.
STF INICIA JULGAMENTO ACERCA DA MANUTENÇÃO DE CRÉDITO DE ICMS EM TRANSFERÊNCIA INTERESTADUAL DE MERCADORIAS ENTRE ESTABELECIMENTOS DO MESMO TITULAR
Em abril deste ano, o Supremo Tribunal Federal (STF), reiterando posição do Superior Tribunal de Justiça (STJ), na Súmula 166, definiu que “o deslocamento de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular não configura fato gerador da incidência de ICMS, ainda que se trate de circulação interestadual”. Com isso, o relator, Ministro Edson Fachin, julgou inconstitucionais os dispositivos da Lei Kandir (Lei Complementar nº 87/96) que previam a incidência de ICMS na saída interestadual de mercadorias destinada a estabelecimento de mesma titularidade do contribuinte.
O entendimento exarado na Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) nº 49 parecia ser uma vitória inconteste dos contribuintes; entretanto, algumas interpretações fazendárias do julgado têm gerado justo receio aos sujeitos passivos do ICMS. Isso porque, muitos fiscos estaduais vêm interpretando que, muito embora, na transferência interestadual de produtos entre estabelecimentos do mesmo titular não haja a incidência do imposto em tela, anular-se-iam os créditos de ICMS acumulados nas operações anteriores por suposto comando do art. 155, § 2º, II, b, da Constituição Federal.
Nesse sentido, o Estado do Rio Grande do Norte, autor da ADC 49, opôs Embargos de Declaração contra a decisão em referência, para fazer o tribunal se manifestar acerca da possibilidade de estorno dos créditos nas mencionadas transferências. Tal hipótese, contudo, foi refutada pelo Ministro Edson Fachin que asseverou que “A transferência interestadual da mercadoria entre estabelecimentos de uma mesma pessoa jurídica equivale, portanto, a mera transferência física”.
Para o relator, em tais transferências não haveria que se falar em operações para fins de ICMS, sendo tal movimentação “equivalente a trocar a mercadoria de prateleira, o que configura, indiscutivelmente, hipótese estranha ao ICMS”. Desse modo, concluiu: “A decisão proferida não afasta o direito ao crédito da operação anterior conforme jurisprudência deste E. STF (RE 1.141.756, Tribunal Pleno, relator Marco Aurélio, j.28.09.2020, DJ 10.11.2020) ao que, em respeito ao princípio da não-cumulatividade, restam mantidos os créditos da operação anterior”.
Votaram com o relator, os Ministros Carmen Lúcia e Alexandre de Moraes. O Ministro Luís Roberto Barroso, apesar de ter entendido que devem ser mantidos os créditos de ICMS nas transferências em comento, propôs modular os efeitos para que a inconstitucionalidade reconhecida tenha eficácia apenas a partir de 2022, e concedendo prazo para que os Estados adequem as suas legislações para regulamentar a forma de transmissão desses créditos. Exaurindo-se esse prazo, o Ministro afirmou que deveria prevalecer a forma anterior de tomada de créditos do ICMS.
Ainda sem decisão definitiva sobre o tema, o julgamento dos Embargos de Declaração foi suspenso em razão do pedido de vista do Ministro Dias Toffoli.
STF SUSPENDE O JULGAMENTO DE ADI ACERCA DA CONSTITUCIONALIDADE DE NORMA GERAL CONTRA O PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO ABUSIVO
No último dia 21 de outubro, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu em razão de pedido de vista do Ministro Dias Toffoli o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 2446, que discute a constitucionalidade da desconsideração, pelas autoridades fiscais, dos atos ou dos negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, norma acrescentada ao Código Tributário Nacional (CTN) – art. 116 parágrafo único – pela Lei Complementar (LC) nº 104/2001.
A análise do leading case havia sido interrompida pela primeira vez em junho de 2020 por um pedido de vista do ministro Ricardo Lewandowski e reiniciada no dia 15 de outubro de 2021, após o voto da Ministra Cármen Lúcia, acompanhada pelos Ministros Marco Aurélio, Edson Fachin, Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes.
A Ministra Cármen Lúcia, relatora do caso, votou pela constitucionalidade do artigo 1º da Lei LC nº 104/2001, na parte em que acrescentou o parágrafo único ao art. 116 do CTN. Segundo a ministra, é inapropriado denominar a norma de antielisão, pois o dispositivo em questão combate a evasão fiscal. Para mais, segundo ela, permitir que o fisco desconsidere referidos atos e negócios jurídicos não viola o princípio da legalidade, já que a norma não impede que o contribuinte busque pelas vias legítimas, economia fiscal, realizando suas atividades de forma menos onerosa.
Por sua vez, o Ministro Ricardo Lewandowski proferiu voto divergente por entender que apenas ao Judiciário competiria declarar a nulidade de ato ou negócio jurídico simulados. Nesse sentido, não caberia ao fisco eleger situações como ilegais para tributá-las.
Até o momento, o julgamento conta com cinco votos favoráveis à constitucionalidade e dois votos contrários. Ainda não há previsão para retorno do julgamento com o voto-vista do Ministro Dias Toffoli.
STF – SUSPENSO O JULGAMENTO DE RECURSO QUE VERSA SOBRE A CONSTITUCIONALIDADE DE PERDÃO DE DÉBITOS DO ICMS DECORRENTES DE BENEFÍCIOS FISCAIS DECLARADOS INCONSTITUCIONAIS
Foi suspenso, após pedido de vista do Ministro Alexandre de Moraes, o julgamento do Recurso Extraordinário (RE) nº 851421 pelo Supremo Tribunal Federal (STF). O caso já conta com voto do Ministro Relator, Roberto Barroso, negando provimento ao recurso do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MP-DF), no que foi acompanhado pela Ministra Carmen Lúcia.
O RE, submetido à sistemática dos recursos de repercussão geral (Tema nº 817), versa sobre a Lei Distrital nº 4.732/2011, que suspende e autoriza a remissão (perdão) de débitos tributários oriundos da diferença entre o regime normal de apuração e o tratamento tributário concedido em decorrência dos benefícios fiscais do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) posteriormente declarados inconstitucionais.
De acordo com o MP-DF, a suspensão da exigibilidade e a remissão de tais débitos importam na convalidação dos benefícios fiscais desconstituídos pelo Judiciário, perpetrando-se uma fraude mediante lei.
Ao se debruçar sobre a controvérsia, o Relator sustentou, em síntese, que a Lei Distrital nº 4.732/2011 está em consonância com os Convênios CONFAZ nº 84/2011 e nº 86/2011, que autorizam a suspensão e a remissão de tais débitos. De acordo com o Ministro Roberto Barroso, a Lei Distrital observa a Lei Complementar º 24/1975, que dispõe sobre a necessidade de convênios para a concessão de benefícios fiscais do ICMS pelos Estados, bem como garante segurança jurídica aos contribuintes que se beneficiaram dos programas antes de sua declaração de inconstitucionalidade.
O Relator propôs a seguinte tese de repercussão geral:
“é constitucional a lei estadual ou distrital que, com amparo em convênio do CONFAZ, conceda remissão de créditos de ICMS oriundos de benefícios fiscais anteriormente julgados inconstitucionais”.
Não há previsão para a retomada do julgamento.
STF DECIDE QUE CONTRATO DE PARCERIA ENTRE SALÕES E PROFISSIONAIS DE BELEZA É CONSTITUCIONAL
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a contratação de profissionais de beleza sob a forma de parceria, prevista na Lei do Salão Parceiro (Lei nº 13.352/2016), não ofende a proteção constitucional da relação de emprego. Por decisão majoritária, o Plenário julgou improcedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 5625, ajuizada pela
Confederação Nacional dos Trabalhadores em Turismo e Hospitalidade – CONTRATUH.
De acordo com o entendimento prevalecente no julgamento, a celebração de contrato de parceria entre salões de beleza e cabeleireiros, barbeiros, esteticistas, manicures, pedicures, depiladores e maquiadores é constitucional, desde que não seja utilizada como forma de fraudar a relação de emprego, pois apenas faculta o contrato de parceria, nas hipóteses em que o ajuste a ser celebrado não abranja os elementos caracterizadores do vínculo empregatício.
Ao final, foi aprovada a seguinte tese:
“É constitucional a celebração de contrato civil de parceria entre salões de beleza e profissionais do setor, nos termos da Lei 13.352/2016. É nulo o contrato civil de parceria referido quando utilizado para dissimular relação de emprego de fato existente, a ser reconhecida sempre que se fizer presente seus elementos caracterizadores”
TRF1 DECIDE QUE É POSSÍVEL BLOQUEIO DO VALOR TOTAL EM CONTA CONJUNTA REFERENTE A DÉBITO FISCAL DE SOMENTE UM DOS TITULARES
A 7ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), no julgamento do Recurso de Apelação nº 0004141-72.2011.4.01.3311, decidiu que é possível o bloqueio do valor total de uma dívida fiscal em conta bancária conjuntas, ainda que o débito apenas se refira a um dos titulares da conta.
O recurso de apelação foi interposto pela União Federal contra sentença que julgou parcialmente procedentes os embargos de terceiro opostos pelo correntista que não era parte na execução fiscal, com o objetivo de desbloquear metade do valor penhorado na conta conjunta. A União Federal, por sua vez, alegou que o contribuinte não demonstrou que a quantia desbloqueada provém do recebimento de salários para comprovar a impenhorabilidade dos valores e que os titulares de conta conjunta possuem responsabilidade solidária pela gestão do saldo da conta.
O relator do caso, Desembargador Hércules Fajoses, deu provimento ao recurso fazendário, afirmando a possibilidade do bloqueio total da quantia depositada em conta conjunta, sob o argumento de que, se um dos titulares poderia realizar o saque de todo o valor depositado na conta sem implicar ofensa ao patrimônio do outro titular, os valores também poderiam ser penhorados em sua integralidade, reconhecendo que a gestão do saldo é de responsabilidade solidária dos titulares.
De acordo com o voto do Desembargador, “É inviável levantar metade da quantia bloqueada em conta-corrente conjunta quando o correntista, apesar de não ser parte na execução fiscal, não apresenta prova cabal da exclusividade dos valores penhorados.”
TRF3 DECIDE PELA NÃO INCIDÊNCIA DE IRRF NA TRANSFERÊNCIA DE COTAS DE FUNDOS DE INVESTIMENTO DO ESPÓLIO PARA O CÔNJUGE
Em acórdão formalizado no último dia 30 de setembro, a Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) decidiu, por unanimidade, afastar a incidência do Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) na transferência das cotas dos fundos do investimento do espólio à titularidade do cônjuge.
Ao julgar a Apelação nº 5012411-08.2017.4.03.6100, a Desembargadora Relatora Mônica Nobre afirmou que não é possível considerar a transferência de titularidade pela sucessão causa mortis como resgate para fins de cobrança do IRRF, tendo em vista que a legislação do Imposto de Renda determina que os investidores apenas estarão sujeitos à tributação quando do resgate das cotas.
O acórdão ainda conta com voto-vista do Desembargador André Nabarrete, que acompanhou a Relatora, ressaltando que, no caso concreto, sequer há diferença positiva entre o valor da alienação e o valor da aplicação financeira pois a cônjuge havia optado pela transferência das cotas pelo valor declarado pelo finado em sua última declaração, de modo que não haveria sequer base de cálculo para a incidência do imposto.
Trata-se de um importante precedente no que se refere ao planejamento sucessório daqueles que optam por investir em Fundos de Investimento, conferindo segurança aos investidores.
OAB DISCUTE NO STF A EXCLUSÃO DE CONTRIBUINTES DO REFIS
O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) ajuizou, em 07/10/2021, a Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) nº 77 com o objetivo de questionar o Parecer nº 1.206/2013 da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), por meio do qual restou firmado o entendimento de que, se os valores recolhidos pelos contribuintes do Programa de Recuperação Fiscal (REFIS) de acordo com o critério legal (porcentagem da receita bruta) forem insuficientes para amortizar a dívida, estes pagamentos podem ser considerados inválidos, configurando-se a inadimplência da empresa e implicando em exclusão do parcelamento, nos termos do art. 5º, II, da Lei nº 9.964/2000.
A OAB visa o reconhecimento da constitucionalidade e a declaração da forma de interpretação adequada para os arts. 5º e 9º da Lei 9.964/2000, que, ao fixar o rol das hipóteses de exclusão de contribuinte do REFIS, não estabeleceu a possibilidade de que as pessoas jurídicas optantes, adimplentes e de boa-fé sejam excluídas do parcelamento em razão de parcelas mensais de pagamento em valores considerados, na ótica da Receita Federal, insuficientes para a quitação da dívida em um prazo razoável.
A ação foi distribuída para relatoria do Ministro Ricardo Lewandowski e encontra-se pendente de inclusão em pauta de julgamento.
CÂMARA SUPERIOR DO CARF ADMITE A COMPENSAÇÃO DOS TRIBUTOS RECOLHIDOS POR PESSOA JURÍDICA QUANDO HÁ RECLASSIFICAÇÃO DAS RECEITAS COMO RENDIMENTOS DA PESSOA FÍSICA
Em 18/10/2021, foi publicado o Acórdão nº 9202-009.957, proferido pela Câmara Superior de Recursos Fiscais do CARF, por meio do qual os membros do colegiado, por unanimidade de votos, deram provimento a Recurso Especial do contribuinte para autorizar a compensação de créditos decorrentes tributos pagos por pessoa jurídica com débitos tributários decorrentes da reclassificação das receitas auferidas pela empresa como rendimentos da pessoa física.
O caso versava sobre receitas oferecidas à tributação como pagamentos decorrentes de prestação de serviços por empresa de engenharia, que teriam sido reclassificados como rendimentos dos sócios pessoas físicas oriundos de vantagens indevidas, ensejando o lançamento do Imposto sobre a Renda da Pessoa Física (IRPF) sobre tais pessoas físicas.
De acordo com a Fazenda Nacional, os valores já recolhidos pela pessoa jurídica não poderiam ser aproveitados na redução do montante devido pelas pessoas físicas pois, em síntese, não haveria previsão legal autorizando a compensação de créditos e débitos de titularidade de sujeitos distintos, bem como que o art. 74 da Lei nº 9.430/96 impõe procedimento específico para a realização de compensações mediante a transmissão de Declaração de Compensação (DCOMP).
No entendimento da Conselheira Relatora, emprestando-se de fundamentação adotada no Acórdão nº 9202-008.603 da mesma Câmara Superior do CARF, o aproveitamento seria admitido pois “a compensação dos tributos já pagos sobre os rendimentos lançados, ainda que pela pessoa jurídica, constitui consequência direta do próprio lançamento”, bem como que entendimento diverso implicaria na movimentação desnecessária da máquina administrativa e enriquecimento ilícito da Administração, que terá recebido duas vezes pelo mesmo fato gerador.
O acórdão em comento está em consonância com outros julgados anteriores da Câmara Superior e dos Colegiados Ordinários do CARF, que entendem que verificada a ocorrência de ato simulado, devem ser desconsiderados todos os seus efeitos, impondo-se a imputação dos valores pagos pela pessoa jurídica nos lançamentos em desfavor das pessoas físicas.
CARF - A CIDE-REMESSAS NÃO INCIDE SOBRE O VALOR DE ROYALTIES DECORRENTES DE DIREITOS AUTORAIS PAGOS A BENEFICIÁRIOS NO EXTERIOR
Em acórdão publicado no último dia 18 de outubro, a 2ª Turma Ordinária da 3ª Câmara da 3ª Seção de Julgamento do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) decidiu, por maioria de votos (5 a 3) que Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico, na modalidade incidente sobre remessas de royalties ao exterior (Cide-Remessas) não incide sobre o pagamento de royalties a beneficiários no exterior em contrapartida à exploração de direitos autorais de obras audiovisuais.
O ponto central da controvérsia residiu no cabimento ou não da cobrança de Cide-Remessas sobre pagamento de royalties a beneficiários no exterior a título de exploração de direitos autorais de obras audiovisuais, conforme contrato em que se firmou os seguintes direitos: “(i) projetar, exibir, reproduzir, transmitir, realizar e distribuir, e (ii) autorizar e licenciar terceiros para projetar, exibir, reproduzir, transmitir e realizar, por meios de distribuição teatral e não teatral (excluindo distribuição não teatral através de linhas aéreas e navios) em todo o “Território” (conforme doravante definido), todos esses filmes cinematográficos (individualmente um “Filme” e coletivamente os “Filmes”, seja, em película ou em vídeo tape, que a Licenciadora tenha ou venha a ter o direito de distribuir deste modo”.
O contribuinte defendeu que: (i) a legislação que regula a CIDE não prevê a remuneração por direitos autorais como hipótese de incidência da mencionada contribuição; (ii) a Fiscalização desconsiderou o Decreto nº 4.195/02, que regulamenta a cobrança da CIDE e lista os contratos que estão sujeitos à incidência (dentre os quais não se encontra a licença de direitos autorais); (iii) a CIDE não pode ser exigida com base em qualificação genérica do contrato, como pretendeu a Fiscalização e, mais ainda, não deve incidir sobre contratos alheios ao campo da tecnologia e assistência técnica (como, claramente, é o caso); e, por fim, que (iv) a CIDE deve estar circunscrita a determinado campo, tanto é assim que a contribuição de intervenção aplicável ao campo de atividade da empresa é a Condecine, sendo, ademais, um bis in idem a cobrança cumulativa da CIDE–Royalties e da Condecine, o que é vedado pelo ordenamento jurídico brasileiro.
Conforme entendimento do Conselheiro Relator Walker Araújo, o Decreto nº 4.195/02 redefiniu o fato gerador da CIDE, restringindo-o aos royalties relativos à transferência de tecnologia, uso de marcas e exploração de patentes. Ponderou assim, que não há, no dispositivo acima colacionado, menção a direitos autorais, como ocorre com o artigo 22 da Lei nº 4.506/64.
Ademais, observou que, não obstante a decisão recorrida tenha afastado dos ditames legais previstos no Decreto nº 4.195/02, sob a justificativa de que a lei deve prevalecer para fins de incidência da CIDE, fato é que referido Decreto também é fonte de normas, as quais, em regra, são inseridas no sistema jurídico para serem observadas (art. 84, IV, da Constituição Federal). Com efeito, se o Decreto nº 4.195/02 especificou o alcance de lei a ele preexistente (Lei nº 10.168/00, com redação dada pela Lei nº 10.332/01), assim o fez objetivando sua fiel execução, devendo, assim, ser devidamente observado (Acórdão nº 3302-011.909).
Trata-se de questão que suscita intensa controvérsia no CARF, existindo decisões tanto pela não incidência, como a ora comentada e a do Acórdão nº 3401-003.833, de 28/06/2017, como pela incidência, a exemplo do Acórdão nº 3401-006.620, de 19/06/2019, e dos Acórdãos da Câmara Superior do CARF nºs 9303-01.864, de 06/03/2012, 9303-004.899, de 23/03/2017, 9303-005-293, de 22/06/2017 e 9303-006.993, de 14/06/2018, 9303-008.5525, de 19/05/2019.
SEFAZ/SP APLICA ENTENDIMENTO DO STF SOBRE NÃO INCIDÊNCIA DE ICMS SOBRE SOFTWARES
Em Resposta à Consulta Tributária nº 24512/2021, publicada em 14 de outubro de 2021, a Secretaria da Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo (Sefaz/SP) aplicou o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade nº 5.659 e 1.945, no que se refere à tributação de softwares.
No julgamento, ocorrido em fevereiro deste ano, o STF decidiu que apenas o ISS incide sobre as operações de licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computador, excluindo-se a incidência do ICMS, independentemente da natureza do software, sendo ele personalizado (sob encomenda) ou padronizado (também chamado de software de prateleira).
No caso analisado pela Sefaz/SP, o contribuinte tem por atividade secundária o desenvolvimento e licenciamento de programas de computador não-customizáveis e apresentou consulta tributária questionando a incidência de ICMS sobre a referida operação, bem como o procedimento a ser adotado para dar baixa no livro registro de inventário dos programas que se encontrariam em estoque.
Seguindo a decisão do STF, a Sefaz/SP respondeu ao questionamento do contribuinte reconhecendo que não há incidência do ICMS nas operações de venda e licenciamento de softwares. Com isso, não restam dúvidas quanto ao impacto do julgamento na legislação do Estado de São Paulo e posicionamento do Fisco paulista, que seguirá o entendimento do STF.
No entanto, ainda é necessário acompanhar a manifestação dos demais Estados para se confirmar que não haverá oposição dos respectivos Fiscos ao entendimento pacificado pelo Supremo.