Publicada Medida Provisória que regulamenta o instituto da transação tributária e cria possibilidade de negociação de dívidas com descontos de até 70%
Foi publicada na data de hoje (17/10/2019) a Medida Provisória nº 899/2019 (MP 899/2019), dispondo sobre o instituto da transação tributária, previsto no art. 171 do Código Tributário Nacional (CTN)[1].
O objetivo da norma é possibilitar que a União, por meio da Secretaria da Receita Federal (RFB) ou da Procuradoria-Geral da Fazenda (PGFN), celebre transações que facilitem o adimplemento das dívidas tributárias, bem como de dívidas ativas das autarquias e fundações públicas federais e de outros débitos que sejam cobrados pela Procuradoria-Geral Federal (PGF) e pela Procuradoria-Geral da União (PGU), seja por meio da concessão de descontos, seja pelo estabelecimento de prazos e formas de pagamento mais facilitados.
A nova norma cria três modalidades de transação, com requisitos e possibilidades específicos, a saber: (i) transação por proposta individual ou por adesão na cobrança da dívida ativa, (ii) transação por adesão no contencioso tributário (judicial ou administrativo) de relevante e disseminada controvérsia jurídica, e (iii) transação por adesão no contencioso administrativo tributário de baixo valor.
A MP 899/2019, contudo, apenas traz maiores detalhamentos das duas primeiras modalidades, conforme trataremos a seguir, delegando ao Secretário Especial da Receita Federal a disciplina da transação em casos de baixo valor, sendo que a definição do conceito de “baixo valor” será dada por ato do Ministro de Estado da Economia.
Na Transação na Cobrança da Dívida Ativa, a celebração desse negócio jurídico poderá ocorrer por proposta da PGFN, de forma individual ou por adesão, bem como por iniciativa do próprio devedor, ou pela PGF e pela PGU.
A proposta de transação poderá incluir a quitação da dívida em até 84 (oitenta e quatro) meses e conceder, no caso de créditos inscritos em dívida ativa da União que sejam classificados como irrecuperáveis ou de difícil recuperação, uma redução de até 50% (cinquenta por cento) do valor total dos créditos a serem transacionados. No caso de pessoa física, microempresa ou empresa de pequeno porte, o valor poderá ser parcelado em até 100 (cem) meses e o desconto concedido pode chegar a 70% (setenta por cento).
Em relação aos débitos passíveis de ser transacionados em tal modalidade, a MP 899/2019 vedou expressamente que a transação recaia sobre débitos do Simples Nacional ou de FGTS e, naturalmente, sobre aqueles não inscritos em dívida ativa da União. Por fim, nessa modalidade, os descontos negociados não poderão resultar em redução do montante principal, nem atingir as multas de natureza penal ou aquelas impostas em razão de sonegação, fraude ou conluio.
É importante destacar que, em princípio, a proposta de transação não suspenderá a exigibilidade dos créditos, nem o andamento das execuções fiscais respectivas, situação diferente do que ocorre com os parcelamentos/”Refis” anteriores, em razão do art. 151, inciso VI, do CTN. Entretanto, a MP admite a suspensão do processo por convenção das partes (suspensão do processo nos moldes do art. 313, II, do Código de Processo Civil - CPC), bem como a suspensão da exigibilidade nos casos em que a transação envolver moratória ou parcelamento (tal como prevê o art. 151, incisos I e VI, do CTN).
As demais exigências da modalidade poderão ser disciplinadas por ato do PGFN, inclusive podendo condicionar a transação ao pagamento de entrada, à apresentação de garantia e à manutenção das já existentes, bem como disciplinar “os critérios para aferição do grau de recuperabilidade das dívidas, os parâmetros para aceitação da transação individual e a concessão de descontos, dentre eles o insucesso dos meios ordinários e convencionais de cobrança e a vinculação dos benefícios a critérios preferencialmente objetivos que incluam ainda a idade da dívida inscrita, a capacidade contributiva do devedor e os custos da cobrança judicial”.
O segundo tipo de transação detalhado pela MP 899/2019 foi a Transação por Adesão no Contencioso Tributário de Relevante e Disseminada Controvérsia Jurídica. Nessa modalidade, é o próprio Ministro de Estado da Economia que propõe, com base em manifestação da PGFN e da RFB, transações de litígios administrativos e/ou judiciais que versem sobre matéria relevante e disseminada.
Um ponto distintivo dessa modalidade em relação à outra é a iniciativa ser exclusiva do Ministro de Estado da Economia, que mandará divulgar proposta de transação na imprensa oficial e nos sítios dos respectivos órgãos na internet, mediante edital que especifique, de maneira objetiva, as hipóteses fáticas e jurídicas nas quais a Fazenda Nacional propõe a transação no contencioso tributário, aberta à adesão de todos os sujeitos passivos que nelas se enquadrem e satisfaçam às condições previstas na MP e no edital.
O art. 13 da MP 899/2019 estabelece que quando da publicação do edital, somente poderá celebrar a transação o contribuinte que tiver “ação judicial, embargos à execução fiscal ou recurso administrativo pendente de julgamento definitivo, relativamente à tese objeto da transação.” Portanto, ao contrário da Transação na Cobrança da Dívida Ativa, os créditos incluídos não precisam estar inscritos em dívida ativa da União.
Nessa modalidade, é importante destacar que o art. 15 expressamente proíbe a celebração de nova transação sobre a mesma controvérsia jurídica em relação ao mesmo sujeito passivo. Proíbe também que haja transação sobre matéria que tenha jurisprudência integralmente favorável ou desfavorável à Fazenda, uma vez que o objetivo da norma é realmente buscar uma negociação mais equilibrada em matérias em que nem as empresas, nem a Fazenda possuem certeza quanto ao posicionamento final.
Para os demais requisitos, essa modalidade de transação em muito se assemelha à anterior, também vedando a inclusão de créditos do Simples Nacional e do FGTS, e estabelecendo os mesmos limites de parcelas e percentuais de desconto.
Alguns requisitos são comuns a ambas modalidades, tais como a exigência de renúncia a qualquer alegação de direito futura sobre a matéria, bem como a necessidade de desistência de quaisquer ações judiciais em trâmite.
De modo geral, portanto, a MP 899/2019 inaugura um novo tipo de negócio jurídico com a União, possibilitando uma análise mais específica do caso concreto dos contribuintes, mediante a avaliação individualizada de sua capacidade contributiva.
A MP 899/2019 será encaminhada ao Congresso Nacional, que deliberará sobre seu conteúdo no prazo de 120 dias (60 dias prorrogáveis, uma vez, por igual período).
[1] “Art. 171. A lei pode facultar, nas condições que estabeleça, aos sujeitos ativo e passivo da obrigação tributária celebrar transação que, mediante concessões mútuas, importe em determinação de litígio e conseqüente extinção de crédito tributário.
Parágrafo único. A lei indicará a autoridade competente para autorizar a transação em cada caso.”